“É a condição básica da vida, ser obrigado a violar a própria identidade”, escreveu Philip K. Dick no livro Blade Runner publicado em 1968. A ficção científica descreve o século 21 em mundo de humanos e andróides autônomos, com os chamados replicantes, robôs tão similares aos homens que é incerto se os personagens são artificiais ou não. Apesar de não vivermos na realidade imaginada pelo autor, as inteligências artificiais de fato ganham cada dia mais espaço na sociedade, e o fator humano é colocado em xeque. Na intenção de garantir a veracidade dos usuários de carne e osso, o CEO da OpenAI, Sam Altman, co-fundou uma startup que criou o Orb, uma máquina que fornece uma prova de humanidade a quem escaneia sua íris. Em troca, o “humano verificado” recebe uma quantia digital para ser utilizada em uma rede global de criptomoedas.
Uma esfera branca de plástico e silicone com uma lente em seu centro é reducionista para descrever uma máquina capaz de traduzir a íris humana em 12.800 dígitos binários. O Orb é produzido pela empresa Tools of Humanity, de Sam Altman, ao lado do alemão Alex Blania, CEO da startup. Segundo o site da companhia, “o orb é um dispositivo de hardware personalizado e de última geração criado para o projeto Worldcoin para verificar humanidade e singularidade de maneira segura e preservando a privacidade”. Em outras palavras, sensores captam informações da íris humana única de cada indivíduo e transforma em um selo de verificação de humanidade que abre portas para utilizar criptomoedas na rede World de humanos verificados.

O Orb cria uma identificação, o World ID, com as imagens da íris e envia os dados ao dispositivo do indivíduo. A empresa afirma que apaga todos os dados da máquina após passar a identificação ao usuário. Em países em que a lei permite, os humanos verificados como tal recebem tokens, equivalentes a cerca de 42 dólares, em uma carteira digital. A moeda virtual pode ser utilizada para pagar taxas de gás e utilizar serviços dentro da rede, com acesso às ferramentas através do aplicativo do projeto World.
Em um evento no mês passado em São Francisco, Altman revelou parcerias da empresa de coleta de íris com outras marcas como o Match Group, dono do Tinder e do Hinge para verificar usuários e combater fraudes nos aplicativos de namoro. Ainda em 2025, o co-fundador da Tools for Humanity pretende lançar, de início nos EUA, um cartão de débito em parceria com a Visa. O país norte-americano recebeu os Orbs apenas no início deste mês, pela maior liberdade ao sistema de criptomoedas por parte do governo Trump.
O Orb é permitido no Brasil?
Presente em mais de cem países, segundo a Exame, os Orbs chegaram ao Brasil em 2024, mas em fevereiro deste ano a Tools for Humanity suspendeu as operações em São Paulo, onde chegou a ter mais de 40 pontos de escaneamento. A Agência Nacional de Dados (ANPD) avaliou que a World não poderia remunerar as pessoas pelo registro de íris, por infringir a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). Quem fez o procedimento antes da suspensão chegou a receber R$600.
Além do país sul-americano, França, Alemanha e Quênia acenderam um alerta em relação aos Orbs e a sua presença nas nações. As europeias investigam a prática de coleta de dados pela World. O governo do Quênia ordenou em agosto de 2024 que a Tools for Humanity parasse de realizar os escaneamentos por “falta de clareza” no processo. A empresa afirma que utiliza duas chaves criptográficas no hardware da máquina, sem possibilidade de exportação de dados, mas acatou com os pedidos governamentais. Após investigação da polícia local, a World voltou a atuar no país africano em setembro do ano passado.
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